quinta-feira, maio 25, 2006

O homem que estava sozinho

Queria casar. Comprar um carro, ir de férias, fazer filhos. Essas coisas. A idade, que não parava de avançar nem por um dia, avisava-o: aos 40, o melhor é fazer pela procriação. Não se tratava de um alarme biológico. Era mais pela dificuldade acrescida em arranjar parceira quando a testa se alonga pela cabeça dentro, quando os capilares que sobram se apresentam descolorados e frágeis, quando os abdominais outrora vincados dão lugar à protuberância arredondada de uma barriga de homem estável na vida. Ele não era estável. Nem ele nem a vida dele - ele era músico. Mas a barriga já a tinha. E os outros obstáculos também os possuía. Daí que, na sua perspectiva, o melhor fosse arranjar companhia, mesmo que fosse a de alguém de quem não gostasse particularmente. Importante era deixar descendência.
Conheceu várias mulheres. Mas isso já ele conhecia antes de tomar esta decisão. Bom, conhecia mas não se deitava com todas. Agora, nesta fase, era assim: cada uma que conhecia, cada uma que tentava embrulhar nos lençóis. Mas andava azarado: em seis meses, apenas duas lhe entraram no quarto e, destas, apenas uma chegou à actividade propriamente dita. A outra arrependeu-se a tempo. E a primeira, a tal que se lhe enfiou na cama, também acabou arrependida - mas esta já com três ou quatro minutos de atraso.
E ele desiludiu-se com a situação. Perante estes resultados, foi decidindo que tinha que tomar atitudes, mudar de vida, pôr-se melhor, recuperar o físico, quiçá, escolher um perfume adequado, usar camisas engomadas. Ou então fingir que não se passava nada e deixar-se estar. Só a ficar velho e sozinho e mais nada. Quando pensou nisto, não gostou da ideia, achou que era pouco e que era triste. Então, decidiu também voltar a fumar.