quarta-feira, dezembro 28, 2011

Os Sortudos (de Charles Bukowski)

[é a primeira vez que me aventuro a traduzir um escritor que admiro. aqui fica.]

presos no trânsito, debaixo de chuva, às seis e um quarto da tarde,
estes são os sortudos, estes são
os plenamente empregados, a maior parte com os seus rádios aos berros
enquanto tentam não pensar nem lembrar-se de nada.

é esta a nossa nova civilização: os homens, da mesma maneira que
já viveram em árvores e em cavernas, agora eles vivem
nos seus automóveis e nas auto-estradas e

as notícias locais são ouvidas uma e outra vez.
nós vamos em primeira e metemos a segunda e reduzimos de novo para primeira.

há um desgraçado empanado na faixa da esquerda,
ele está de pé encostado ao separador da auto-estrada
com um jornal por cima da cabeça, à chuva.

os outros carros têm de se desviar do carro dele, meter-se à força
na faixa do lado, à frente de carros determinados em não os deixar entrar.

na faixa à minha direita um condutor está a ser seguido por um
carro da polícia com as luzes azuis e vermelhas a piscar – ele seguramente
não pode ir em excesso de velocidade já que

de repente cai uma chuvada gigante e todos os
carros param e

mesmo com a minha janela fechada sinto o cheiro a queimado
da embraiagem de alguém.

só espero que não seja a minha

e a parede de água diminui e lá vamos nós
metemos a primeira; estamos todos parados
bem longe de casa e eu memorizo
a silhueta do carro à minha frente e a forma da

cabeça do condutor ou
o que
eu consigo vislumbrar acima do apoio do banco enquanto
o seu autocolante no pára-choques me pergunta
JÁ DESTE UM ABRAÇO AO TEU PUTO HOJE?

de repente eu tenho que gritar
e lá cai mais uma parede de água e o
gajo na rádio diz que há 70 por cento
de possibilidades de aguaceiros amanhã à noite